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FOCO NA QUALIDADE DA SAÚDE
19/05/2017

No período 2009 2012 a Europa enfrentou uma desaceleração do crescimento econômico, enquanto os gastos com saúde continuaram a crescer no mesmo ritmo. Para a maioria dos governos, esse conjunto de fatores desencadeou uma resposta de política pública destinada a garantir a sustentabilidade do sistema de assistência médica. A Holanda conseguiu dobrar para baixo a curva de custos por meio da assinatura de compromissos com todas as partes envolvidas. Todas elas aprovaram um crescimento limitado, de apenas 1%, a partir de 2013, em vez dos mais de 3% anteriores (OCDE, "Health at a Glance 2015").

Esse crescimento limitado foi conquistado por contratos individuais (de crescimento) entre compradores e fornecedores no nível municipal. Mais uma vez o famoso "modelo pôlder" holandês ajudou: a formulação de política pública baseada no consenso é o nosso DNA desde que aprendemos a agir em colaboração a fim de proteger nosso país situado abaixo do nível do mar das enchentes.

O principal desafio para a crise foi superado. Desde 2013 o crescimento com gastos de saúde segue uma trajetória sustentável inferior ao PIB. Além disso, a qualidade e o acesso não foram prejudicadas pela retração dos custos. Mas ainda não chegamos lá. Um novo desafio nos espera. Surgem os primeiros sinais de crescimento puxado pela redução da diferença e os outros fatores de expansão dos gastos também estão se desenvolvendo rapidamente. Foi necessário focar em controle de custos durante a crise. Para continuar melhorando a assistência médica na Holanda será necessário deslocar o foco para os resultados.

A essência da criação de gastos sustentáveis de saúde pode não estar no foco do controle de custos, e sim na criação de melhor valor para os pacientes. Principalmente para o paciente portador de doenças múltiplas (crônicas). Devido aos avanços científicos e tecnológicos, nosso sistema de saúde melhora, as pessoas vivem mais e as doenças se tornam crônicas, em vez de fatais.

Ao mesmo tempo, a multimorbidade impõe seu preço: 1% da população responde por 23% dos gastos com assistência médica (Wammes, 2016). Movimentar esses pacientes por todo o sistema de saúde a fim de receberem a assistência certa no lugar certo é fundamental. Relatório recentemente publicado da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) "Tackling wasteful spending on health"("Administrando os gastos desnecessários de saúde") mostra que 20% das despesas com saúde nos países da OCDE poderiam ser canalizados para um uso melhor.

No período subsequente a Holanda vai se concentrar em manter a qualidade do sistema de saúde e, mais especificamente, em obter melhores informações sobre a qualidade da assistência. A política pública deve ser formulada da mesma maneira pela qual um médico formula seu diagnóstico: de forma cuidadosa e bem fundamentada. Para ter dados melhores sobre a qualidade, o registro desses dados tem de ser melhorado. A Holanda investe pesado nessa área, mas são necessários novos avanços.

Desde 2013 o crescimento com gastos de saúde segue uma trajetória sustentável, inferior ao do PIB. Além disso, a qualidade e acesso não foram prejudicados pela retração dos custos. Para seguir melhorando, é necessário deslocar o foco para os resultados

Pesquisa recente mostra a importância do registro de qualidade do resultado. Comparar desempenhos de hospitais tanto sob o aspecto da qualidade quanto sob o dos custos proporciona descobertas valiosas sobre as áreas em que os tratamentos devem ser melhorados. Isso tem forte potencial de reduzir os custos hospitalares, simplesmente porque a assistência de alto valor leva a menos reinternações e complicações.

Um exemplo que ilustra como usar esses dados é o "beternietdoenlijst" (lista do que não deve ser feito). A empresa holandesa IQ Healthcare mapeou a variação da prática médica e detectou 1366 serviços de menor valor.

Sabemos que o Brasil também está prospectando as oportunidades de aumentar o valor para os pacientes, e os próximos eventos do setor de saúde, como a feira Hospitalar e fóruns, nos oferecerão oportunidade de compartilhar experiências.

A Holanda está na lista dos 10 principais países em termos de inovação de acordo com o Fórum Econômico Mundial, e isso também abrange nosso setor de assistência médica. A política de saúde rápida na superação de problemas é caracterizada pelo espaço dado às soluções inovadoras e aos modelos de negócios, como a Buurtzorg e a ParksinsonNet, duas fundações socialmente inovadoras que conceberam uma maneira nova e eficiente de cuidar dos pacientes em casa (Buurtzorg) e de oferecer assistência especializada a pacientes portadores de Mal de Parkinson (ParkinsonNet). Ambas as inovações tecnológicas e sociais são vitais para atender às demandas futuras. Felizmente, o desenvolvimento tecnológico parece (ainda) evoluir mais rápido do que a crescente demanda por assistência.

Acreditamos firmemente que nosso foco tem de se voltar para o paciente. O paciente, especialmente o paciente crônico, é seu próprio, e seu melhor, profissional de saúde. Além disso, todo paciente é singular e, para fornecer assistência personalizada é essencial que os profissionais envolvam os pacientes no processo de tomada de decisões. A pesquisa prova que o compartilhamento de decisões é uma situação vantajosa para ambos os lados: o paciente sente que desempenha papel fundamental no processo e, ao contrário do que se poderia pensar, isso leva a uma redução dos custos com assistência médica.

Na Holanda há várias ferramentas desenvolvidas para envolver mais os pacientes, como o site kiesbeter.nl ("escolha melhor") e o aplicativo "Drie Goede Vragen in de Spreekkamer" (Três boas perguntas no consultório"). Acreditamos que "é mais importante saber que tipo de pessoa tem uma doença do que saber que tipo de doença a pessoa tem", como sustentava Hipócrates.

A abordagem centrada no paciente deve ser o cerne de todo sistema de saúde e o ponto de partida para cada profissional, seja em assistência médica ou em formulação de políticas públicas. Na Holanda, orgulhamo-nos do nosso sistema de saúde e buscamos constantemente maneiras de superar nossos resultados anteriores. Nos últimos cinco anos fomos qualificados como o melhor sistema de saúde da Europa, do ponto de vista do paciente. Isso significa que o nosso modelo de assistência médica corresponde à expectativa. E fazemos isso por meio de parcerias públicoprivadas,

PPPs. É o governo, juntamente com os pacientes e com organizações privadas que está fornecendo assistência médica de alta qualidade. Parte dessas organizações estarão comigo no Brasil para dividir experiências e ver o que temos a oferecer uns aos outros.

Os desdobramentos passados e presentes da assistência médica brasileira são de grande importância para nós. Da estratégia do programa brasileiro Saúde da Família de usar funcionários de saúde da comunidade para prestar atenção primária até soluções digitais de saúde futuras. Estamos ansiosos por saber mais sobre os desafios brasileiros na saúde e por conseguirmos compartilhar experiências, trabalhar juntos para enfrentar desafios, que são, na verdade, problemas sociais mundiais que transcendem as nossas fronteiras. (Tradução de Rachel Warszawski)

Bas van den Dungen é vice ministro de Saúde do Ministério de Saúde, Bem Estar e Esporte da Holanda.


Fonte: Valor Econômico