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Ainda longe de um Brasil sem Aids

O ministro da saúde recém-demitido, Arthur Chioro, previu o colapso do SUS (Sistema Único de Saúde) em 2016.

O atual, Marcelo Castro, disse que o que hoje está ruim vai piorar.

 
O SUS vive sua pior crise desde que Congresso Nacional e governo aprovaram, no começo deste ano, emenda constitucional que reduziu o financiamento federal da saúde.
 
Depois vieram a diminuição de repasses a Estados e municípios e a recessão que minou as fontes de financiamento da saúde dependentes de tributos ligados à atividade econômica.
 
A ruína do SUS é agravada pelas desonerações e pela regulação frouxa, que beneficiam planos de saúde e hospitais privados –vide a abertura irrestrita do setor ao capital estrangeiro.
 
A essas medidas que inviabilizam o sistema universal constitucional soma-se a ameaça de uma agenda ultraconservadora, que coloca em risco até mesmo políticas outrora exemplares. É o caso do combate à Aids, que mudou para pior.
 
Relegada a especialistas, fora da mídia e da visibilidade pública, a Aids não é mais a causa excepcional que fez emergir a ousadia do ativismo, a inovação na prevenção, a coragem dos programas governamentais, o engajamento de profissionais e de redes associativas solidárias.
 
O distanciamento de setores como educação, direitos humanos e trabalho é outro sintoma do encolhimento da luta contra a Aids no Brasil. Os retrocessos são também expressão do conservadorismo e do pragmatismo medíocre que imperam na política.
 
Abandonou-se a abordagem dos determinantes sociais da epidemia –entre eles a violência, o preconceito, a homofobia– e deixou-se de promover os direitos e a dignidade das pessoas e populações mais afetadas.
 
A autocensura do Ministério da Saúde, ao impedir campanha dirigida a jovens gays, precedida da suspensão de material que tratava de sexualidade nas escolas, selou a rendição à direita hidrófoba e aos religiosos fundamentalistas que, agora na Câmara dos Deputados, querem impedir o aborto de mulheres vítimas de violência sexual e definir como família apenas as relações entre homens e mulheres.
 
A propaganda governamental alardeia a suposta estabilidade do número de casos e vende a ideia de que a doença será detida apenas com as novidades biomédicas.
 
O início do tratamento passou a ser recomendado a todas as pessoas com HIV. O teste rápido está no SUS e o autoexame já pode ser adquirido em farmácias.
 
Para pessoas que praticaram relações sexuais desprotegidas estão disponíveis antirretrovirais, que também já são recomendados para prevenção dirigida –por exemplo, homens que fazem sexo com homens e que têm dificuldades de usar a camisinha.
 
Por causa de medicamentos eficazes, mais aceitos pelo organismo, uma pessoa infectada recentemente pode ter a mesma esperança de vida que uma pessoa sem HIV.
 
Tudo isso –a chamada "prevenção combinada"– é um grande avanço, sem dúvida. Mas não é o que vai garantir um Brasil sem Aids no futuro.
 
A volta da Aids com força total está evidente nas novas infecções, no aumento de mortes nas regiões Sul e Norte, na retomada dos comportamentos de risco e na baixa realização de teste de HIV entre populações mais vulneráveis.
 
Pintar de cor-de-rosa a Aids, como fazem as autoridades, é uma farsa evidente. Hoje, quando se celebra o Dia Mundial de Luta Contra a Aids, é preciso dizer que a epidemia não será vencida apenas com testes, pílulas e preservativos.