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DGABC: REFORMA TRABALHISTA E CRISE PODEM AGRAVAR PRECARIZAÇÃO DO SUS
22/10/2018

Atualmente, 37,23% dos moradores do Grande ABC são beneficiados por planos de saúde empresariais. Isso significa que 1,03 milhão de pessoas podem ficar sem cobertura em caso de demissão ou aposentadoria, uma vez que nem sempre é possível permanecer com o benefício após a saída da empresa. Ainda, contratos de trabalho como terceirizado e autônomo, além do contrato intermitente e regime home office não incluem, entre outros benefícios, o convênio médico.
Esses fatores, aliados aos altos preços para contratar plano de saúde, podem fazer com que a população recorra ao SUS (Sistema Único de Saúde), precarizando, ainda mais, o serviço – e gerando sobrecarga na região. Os dados são da quarta Carta de Conjuntura do Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano).

Isso acontece, principalmente, por conta do baixo investimento no SUS, que totalizou, no País, R$ 265 bilhões em 2017, quantia utilizada para atender os 80% dos brasileiros que não contam com convênio médico. “Em razão do congelamento dos gastos públicos, aprovado em 2016, certamente ocorrerá uma precarização ainda maior do sistema público. O SUS não terá condições de aumentar o seu orçamento para absorver essa população, deixando as pessoas desatendidas”, observa Maria da Consolação Vegi da Conceição, advogada trabalhista e responsável pela pesquisa do Conjuscs.

A pesquisadora explica que essa crise começou a ser delineada após duas deliberações do STJ (Superior Tribunal de Justiça). “Decisão de 2017 autorizou a cobrança por faixa etária, o que impacta em cheio os aposentados. Já veredito de agosto deste ano não permite a permanência de trabalhadores dispensados que tinham o plano subsidiado exclusivamente pela empresa.”

Segundo a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), demitidos ou exonerados sem justa causa podem permanecer com o convênio médico por período equivalente a um terço do tempo total de pagamento, sendo o mínimo de seis meses e, o máximo, dois anos.

“Precisamos lembrar que estamos falando de vidas que, em alguns casos, estão em momentos sensíveis por conta de uma doença, por exemplo, e tem seu tratamento limitado a uma demissão”, assinala Ana Paula Satcheki, advogada especialista em Direito do Consumidor. “A pessoa já perdeu sua renda. Como irá pagar pelo convênio médico?”, questiona.

Em alguns casos, quando há demissão em massa ou negociação de PDV (Programa de Demissão Voluntária), os sindicatos acordam com as empresas a extensão do benefício por tempo determinado. “É uma questão social, pois envolve a família. Sempre tentamos negociar para encontrar a melhor maneira de mantê-lo”, afirma Carlos Caramelo, diretor executivo do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

Para os aposentados, a extensão pode acontecer durante período equivalente aos anos ou meses trabalhados para quem atuou por menos de uma década na empresa. Para os colaboradores que trabalharam por mais de dez anos no local, o tempo de permanência do benefício é indefinido enquanto a empresa mantiver o plano de saúde para os empregados ativos.

Dado que a pessoa, a partir do momento que deixa a empresa, deve arcar com o custo integral do serviço, torna-se “praticamente impossível para um aposentado, que vive do benefício, pagar seu plano de saúde”, afirma Maria da Consolação. “Como em geral o trabalhador tem pelo menos duas pessoas em seu convênio, o valor mensal seria de R$ 3.705,66, quantia impossível de ser suportada por eles.”

Assim, a pesquisadora acredita que a queda dos preços cobrados pelas operadoras ajudaria a amenizar a situação e evitaria sobrecarga ao SUS. “Além de os trabalhadores desligados e aposentados terem mais condições de continuar com o plano, as empresas seriam estimuladas a manter ou contratar tais planos”, avalia.

Vale destacar que, historicamente, o reajuste dos convênios médicos fica acima da inflação. No ano passado, por exemplo, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) encerrou a 2,95%, enquanto média da inflação com gastos médicos atingiu 15,46%. “Nos planos de saúde, porém, o valor considerado pode ser até 30% maior do que o custo hospitalar real”, pontua Caramelo. “O governo deveria exercer o papel de fiscalizar e baratear esses contratos.”

Planos são 12% da folha de pagamento

Os desembolsos com plano de saúde representam 12,3% da folha de pagamento das indústrias, segundo a CNI (Confederação Nacional das Indústrias). Diante disso, a entidade procurou o governo para apresentar proposta cujo objetivo é frear esses gastos por meio da remuneração dos prestadores com base nos resultados, e não em procedimentos, além da criação de programas de prevenção pelas empresas, entre outras medidas.

Maria da Consolação Vegi da Conceição, responsável pela pesquisa do Conjuscs, observa que algumas companhias investem em ações de incentivo ao exercício físico, por exemplo, porém tais incentivos paliativos não são suficientes para reduzir, expressivamente, o dispêndio com o convênio.

Deste modo, a redução do percentual de reajuste praticado pelas operadoras é essencial, assim como a fiscalização e regulação pela ANS.

Vale dizer que, justo por conta da quantidade e do porte das indústrias da região, o percentual da população contemplada por planos empresariais é mais que o dobro do que no País – 37,23%, ou 1,03 milhão, ante 15,13%, o que representa 31,6 milhões de pessoas.

Regras da ANS nesses casos são insuficientes, avalia especialista

Na avaliação de Ana Paula Satcheki, advogada especialista em Direito do Consumidor, as atuais determinações da ANS em relação à extensão dos planos de saúde empresariais são insuficientes. “Elas são poucas e não absorvem diversas situações”, afirma.

“O tempo proposto é razoável. Mas e em casos em que a pessoa está em tratamento de alguma doença? E se está aguardando uma cirurgia? Não há definições sobre como proceder nessas situações. O prazo é único”, critica Ana Paula.

Nessas situações pontuais, a especialista orienta que os beneficiados procurem a Justiça. “Será possível verificar se há algum abuso de preço ou em que circunstâncias a empresa avisou, previamente, sobre a necessidade de saída do plano”, explica. “Vale lembrar que pessoas com doenças preexistentes não podem aderir a novos convênios por conta da carência, assim, não é possível fazer a migração de operadora”, completa.

Por outro lado, Ana Paula salienta que, de modo geral, o que vale é o contrato firmado entre a empresa e a operadora, ou em acordo coletivo com o sindicato. Por esse motivo, inclusive, a ANS tem dificuldade de fiscalizar esses modelos, uma vez que se trata de acordo entre partes privadas. “A agência precisa criar regras mais rígidas e fiscalizar.”


Fonte: ANAHP