Fone: (11) 3242-8111 Fax: (11) 3112-0554 | Endereço: Rua Libero Badaró, 158 – 6º andar – São Paulo – SP

Empurrando a saúde
11/05/2015

Novos dados sobre a defasagem da tabela de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS) – principal responsável pela crise dos hospitais a ele conveniados e que representam 47% dos atendimentos da rede pública – são revelados por estudo do Conselho Federal de Medicina (CFM). Eles deixam em situação difícil as administrações federais – das quais a atualização ou não da tabela depende – de 2008 a 2014, ou seja, os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, que nada fizeram para evitar que a situação se deteriorasse.
 
Nesse período, dos 1.500 procedimentos hospitalares pesquisados daquela tabela, nada menos do que 74% (1.118) não tiveram seus valores atualizados de acordo com a inflação. O CFM teve o cuidado de usar dados do Sistema de Informações Hospitalares do SUS, portanto do próprio Ministério da Saúde, para determinar o valor médio pago para cada tipo de procedimento em 2008 e 2014. Calculou em seguida qual seria o valor atualizado que seria pago em 2014, se ele tivesse sido corrigido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), como mostra reportagem do Estado.
 
Por exemplo, por parto normal feito pelo SUS em 2008, os hospitais receberam R$ 472,27. Se corrigido pela inflação, esse valor subiria para R$ 701,89 em 2014. Mas isso não aconteceu e o SUS pagou no ano passado apenas R$ 550,42, uma defasagem de 28%. A defasagem de um parto cesariano foi de 40% e a de tratamento de doenças infecciosas e intestinais, de 32%. O caso extremo é do tratamento cirúrgico de fraturas da caixa torácica (gradil costal), com defasagem de 434%.
 
O grave no caso não é apenas o fato de que a ausência de correção pela inflação, que seria o mínimo, agrava a defasagem de um pagamento que já não é satisfatório. É principalmente a atitude deliberada do governo de na prática, por esse meio esperto, fazer economia – ou que outro nome se queira dar a isso, não importa – à custa da saúde das camadas mais carentes da população, que só podem ser atendidas pelo SUS.
 
A alta, acima da inflação, de alguns produtos e serviços fundamentais para o funcionamento dos hospitais é mais um elemento a demonstrar que a correção da tabela pelo IPCA seria de fato o mínimo a fazer. Segundo o CFM, o aumento de produtos alimentícios foi de 58,45%, entre janeiro de 2008 e dezembro de 2014, enquanto o IPCA desse período foi de 48,62%. Os preços de materiais usados em serviços de conservação e manutenção subiram 52,07% e os gastos com locação, impostos e condomínios de imóveis, 57,76%.
 
A combinação desses elementos tem representado um duro golpe nas finanças de instituições e empresas conveniadas ao SUS – Santas Casas e hospitais filantrópicos. A defasagem da tabela do SUS é responsável pela diminuição do número de hospitais que trabalham com a rede pública, segundo Hermann von Tiesenhausen, primeiro-secretário do CFM. Mais de 100 deles fecharam ou deixaram de atender pelo SUS nos últimos dez anos, diz ele, e isso tem um impacto direto na qualidade do atendimento da rede pública, porque aumenta as filas de espera e a lotação dos que mantêm o convênio.
 
Alega o Ministério da Saúde que a tabela do SUS já não é mais a única fonte de financiamento da saúde pública, porque o governo vem aumentando nos últimos anos o valor dos incentivos financeiros às Santas Casas e aos hospitais filantrópicos. De 2010 a 2014, o total repassado para procedimentos de média e de alta complexidade (tabela do SUS e incentivos) cresceu 46%, enquanto a inflação do período ficou em 25%.
 
Isto parece ser mais uma forma de fugir do problema – no máximo, de amenizá-lo – do que de enfrentá-lo. Como diz o presidente da Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos, Edson Rogatti, na maioria dos casos os incentivos não são suficientes para cobrir o déficit: “A tabela do SUS cobre só 60% dos nossos custos e os incentivos ajudam, mas não fecham a conta”.

E assim o governo vai empurrando e adiando a solução dos graves problemas de um setor vital como o da saúde. 

Fonte: O Estado de S. Paulo