LIDERADO POR MULHERES, FUNDO DISTRIBUIU R$ 40 MILHÕES PARA HOSPITAIS
22/12/2020
Carola Matarazzo (Movimento Bem Maior) e Mariana de Salles Oliveira (BSocial) foram pegas de surpresa no dia 27 de julho em uma reunião com o HSP (Hospital São Paulo), quando o estado registrava 10 mil novos casos de Covid-19 por dia.
Representavam no encontro o Fundo Emergencial para a Saúde, que fundaram com Paula Fabiani, 49, presidente do Idis (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social), para socorrer Santas Casas e hospitais filantrópicos na pandemia.
A videochamada sobre o uso de verbas direcionadas pelo fundo ao HSP tornou-se uma espécie de cerimônia virtual de agradecimento.
A equipe da UTI relatou como a doação mudou sua rotina. Com R$ 1,9 milhão recebido, o hospital comprou novas bombas de injeção de medicamento, que livraram os profissionais da difícil tarefa de escolher quais pacientes receberiam tratamento e quais ficariam sem.
“Estávamos frente a um inimigo desconhecido. Faltavam informação e infraestrutura, não tínhamos nem equipamentos de segurança suficientes”, diz Manoel Girão, diretor da Escola Paulista de Medicina da Unifesp e presidente do conselho estratégico do Hospital São Paulo.
Ele lembra que, no primeiro contato com as gestoras, até duvidou da iniciativa de um fundo voltado para o socorro aos hospitais, bom demais para ser verdade.
“Em meio a tanto sofrimento, foi um alento passar dias e noites trabalhando para apoiar quem estava na linha de frente”, diz Paula.
Era um mutirão de captação de recursos, um trabalho conjunto da economista com a psicóloga Mariana, 45, e a administradora Carola, 54.
O trio subverteu o ditado que diz “Quem quer ir rápido, vai sozinho. Quem quer ir longe, vai em grupo”.
“O fundo nos ensinou que é possível ir rápido e longe ao mesmo tempo diante do avanço da pandemia no país”, diz Paula.
Uma experiência marcada pela força do feminino, já que as três líderes da iniciativa contaram com apoio da jornalista Andréa Wolffenbuttell (Idis) e das outras duas cofundadoras da BSocial, Maria Duva Gullo e Flora Botelho.
“Foi um trabalho em rede, descentralizado, onde se formou uma equipe focada e sem ego que trabalhou por uma urgência, um propósito único”, descreve Carola.
Paula atribui o sucesso do fundo à liderança feminina: “As mulheres têm uma preocupação genuína com o próximo, e isso fez a diferença.”
Atento ao cenário da Covid-19 em outros países e à demanda exponencial por leitos hospitalares, o sexteto feminino decidiu que o foco do fundo emergencial seria o fortalecimento do SUS.
Assim, as empreendedoras sociais e suas equipes perderam madrugadas de sono e fins de semana atrás de recursos.
Em cinco meses, levantaram mais de R$ 40 milhões. O valor surpreendeu Paula, que tinha como meta inicial captar R$ 5 milhões.
“A cada R$ 5.000, a gente comemorava”, recorda-se ela, ao ver o volume total de recursos multiplicado por oito.
A chave do sucesso foi como se organizaram para a ação. Carola e Paula lideravam as equipes do Idis e do Movimento Bem Maior para fechar parcerias e captar grandes doadores entre filantropos e empresas.
Enquanto isso, Mariana movia o pessoal da BSocial, plataforma de doação online, para reduzir ao máximo suas taxas e atrair doadores individuais.
“É uma aliança com propósito, e isso faz o trabalho ser ágil, maduro e organizado, sem ego envolvido”, diz Mariana, destacando a expertise das entidades como atores sociais e da cultura de doação.
Ao todo conseguiram mais de 10 mil doadores, entre empresas de todos os tamanhos e áreas variadas, pessoas físicas, organizações e famílias voltadas à filantropia.
Foi assim que 53 cidades de 25 estados do país tiveram seus hospitais filantrópicos e Santas Casas fortalecidos em um momento crítico.
A seleção dos hospitais beneficiados foi rigorosa, pautada por um conselho técnico formado pelos médicos Marcos Kisil, José Antonio de Lima e José Luiz Setúbal.
A dura missão de escolher quais hospitais receberiam doações e quais ficariam de fora contou com trabalho pro bono da PLKC Advogados e da Sitawi Finanças do Bem, que cuidaram da parte jurídica e financeira do fundo.
E conseguiram algo inédito: “Pela primeira vez, os hospitais não precisavam pedir por contribuições, éramos nós que íamos atrás e levávamos até eles”, afirma Carola, portadora das boas-novas por quase todo o país.
Mariana destaca o impacto nas equipes envolvidas: “Ao saber da doação, os profissionais se emocionavam, sentiam-se vistos, com seus esforços pela saúde reconhecidos pela primeira vez”.
Cláudio Bonduki, docente de ginecologia da Escola Paulista de Medicina, que foi a ponte entre o fundo e o Hospital São Paulo, diz que conhecer Carola foi uma felicidade.
“Com a ajuda do fundo, pudemos nos estruturar e atender aos infectados de maneira humana e eficaz. Somos muito gratos às meninas do Fundo Emergencial para a Saúde.”
Além da realização por contribuir para o SUS, Carola resume o sentimento por trás da iniciativa: “Saber que pude colaborar para salvar ao menos uma vida já me deixa extremamente grata”.
E foram milhares de vidas salvas, em uma conta que ainda não fechou.
FUNDO EMERGENCIAL PARA A SAÚDE
- Milhares de pessoas impactadas
- R$ 40 milhões em recursos mobilizados
- 60 instituições de 25 estados foram beneficiadas
- 16 Santas Casas de saúde receberam recursos do fundo
- 2,8 milhões de EPIs distribuídos
- 125 mil testes para Covid-19 realizados
- 1.653 equipamentos hospitalares doados
Folha de S. Paulo