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COM DÍVIDAS DE R$ 10 MILHÕES, HOSPITAIS DA REGIÃO DE RIO PRETO RECORREM A QUERMESSES E LEILÕES
08/05/2023

Primeiros hospitais da região de Rio Preto, as Santas Casas lutam para continuar atendendo a população. Levantamento feito pelo Diário aponta que somado o valor das dívidas dos 26 hospitais filantrópicos do Noroeste Paulista já ultrapassa os R$ 10 milhões. Para sobreviver, as Santas Casas que atendem, em média, 3 mil pessoas por dia estão recorrendo a cofrinhos, quermesses e até descontos autorizados pela população na conta de água.

Responsáveis por fazer o primeiro atendimento de boa parte dos 2 milhões de moradores da região, as Santas Casas funcionam como hospitais referência em atendimentos de pequena e média complexidade nas microrregiões do Noroeste Paulista. Para ter uma ideia, juntas elas concentram 1,2 mil leitos.

Com a pandemia do coronavírus, envelhecimento da população – o que requer maior procura por atendimento de saúde – e alta no preço de produtos hospitalares, a situação financeiras das Santas Casas que já estava complicada, somente piorou. Até a tradicional ajuda da comunidade diminuiu, em função do baixo poder de compra da população nos últimos meses.

O reflexo foi que enquanto as contas e atendimentos aumentaram, a arrecadação diminuiu. O que piorou a situação desses hospitais públicos, que apesar de receberem repasses da União e do governo estadual, dependem diretamente da ajuda da população para continuar funcionando.

"A pandemia impactou e muito a situação financeira das instituições filantrópicas. Passamos a atender a demanda da Covid-19, sem deixar de atender a todos os outros pacientes, como vítimas de acidentes, pessoas com outras doenças, serviços de maternidade e pediatria. Ao mesmo tempo, sofremos com a alta exorbitante dos preços de insumos, medicamentos, EPIs (Equipamentos de Proteção Individual). Todo esse cenário fragilizou ainda mais o orçamento dos hospitais”, explicou Mirocles Véras, presidente da Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos (CMB).

Outro problema apontado por gestores de saúde e provedores das Santas Casas da região é a tabela de procedimentos do SUS (Sistema Único de Saúde), que não é reajustada há quase 20 anos.

“O SUS cobre, em média, 60% dos custos dos procedimentos realizados, tendo a instituição que encontrar maneiras de complementar o restante destes valores”, afirmou Mirocles.

Cofrinhos e quermesses

Na região, entre as Santas Casas que estão com dívidas superiores a um milhão de reais estão a de José Bonifácio, Fernandópolis, Santa Fé do Sul e Jales.

"Para tentar conseguir pagar as contas no final do ano, realizamos leilão de gado; temos o projeto no qual os moradores contribuem diretamente na sua conta de água com qualquer valor e a própria festa com rodeio, em que a prefeitura promove e direciona a renda em prol da Santa Casa”, disse Reinaldo Favaro, administrador da Santa Casa de José Bonifácio.

Na segunda maior Santa Casa do Noroeste Paulista, localizada em Votuporanga, para conseguir manter o funcionamento dos 214 leitos, o administrador Angelo Jabur Bimbato conta que além da ajuda do governo estadual e federal, a população continua sendo a grande parceira.

"Recebemos doações de diversas formas, como dinheiro, por meio de campanhas e até mesmo de alimentos. Os voluntários realizam leilões, quermesses, arrastões em prol do hospital. Além disso, temos a campanha ‘Saúde que dá prêmios’. Nela, os moradores destinam uma quantia para o hospital por meio da conta de água, revertida em atendimento do Sistema Único de Saúde, e concorrem mensalmente a uma televisão smart”, diz.

Já em Jales, a Santa Casa que é referência para 16 municípios da microrregião, consegue manter os atendimentos através de emendas parlamentares, doações espontâneas e cofrinhos que são instalados em estabelecimentos comerciais para que a população ajude com qualquer valor.

Hospitais públicos brasileiros

Diferente de hospitais particulares, as Santas Casas são entidades sem fins lucrativos, sendo parte fundamental do sistema de saúde público brasileiro, uma vez que, sem essas instituições, os governos municipais e estaduais, assim como o governo federal, não conseguiriam promover o acesso universal à saúde, conforme determinado pela Constituição Federal.

“Em regra, as Santas Casas são filantrópicas e, portanto, não possuem fins lucrativos. Ao longo das décadas, esses hospitais têm sido a grande retaguarda de atendimentos hospitalares no SUS, possibilitando atendimentos em municípios afastados dos centros urbanos”, ressaltou Adelvânio Francisco Morato, presidente da Federação Brasileira dos Hospitais.

Dados da Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos (CMB) mostram que o Brasil possui 1.812 Santas Casas e Hospitais Filantrópicos, sendo que em 900 municípios brasileiros, elas são o único equipamento de saúde para atendimento de toda a população.

É o que acontece em Cardoso, lá a Santa Casa Leonor Mendes de Barros é referência em atendimento público de saúde para atendimentos oftalmológicos e atendimentos e urgência e emergência.

“Além da relevância para a saúde, os hospitais filantrópicos brasileiros têm grande papel no setor econômico, gerando mais de um milhão de empregos (diretos e indiretos)”, pontuou Mirocles Véras, presidente da CMB.

Em municípios, com mais de 30 mil habitantes, por exemplo, as santas casas também chegam a realizar procedimentos mais complexos, como partos. É o caso, por exemplo, da Santa Casa de Fernandópolis que efetua cirurgias e atendimento de alta complexidades em ortopedia e traumatologia e conta com unidades de terapia intensiva (UTI).

“As Santas Casas precisam, antes de tudo, de valorização. Por isso, lutamos tanto por uma necessária revisão dos valores pagos pela tabela do SUS. Por outro lado, também é necessário reduzir a carga de impostos que incidem sobre o setor. Atualmente, a dívida da rede hospitalar com o Tesouro Nacional é de mais de R$ 70 Bilhões”, afirmou Adelvânio. (RC)

Ajuda de R$ 19 milhões à região

Como forma de ajudar os hospitais filantrópicos a readequarem suas contas, o governo federal informou que vai liberar 19 milhões para as Santas Casas da região de Rio Preto.

O maior valor será para Santa Casa de Rio Preto que sozinha vai receber R$ 7.235.027,61; em seguida, aparece a Santa Casa de Votuporanga (R$ 4.132.304,74), Santa Casa de Fernandópolis (2.127.603,86), Santa Casa de Jales (1.197.647,90), Santa Casa de Santa Fé do Sul (664.492,68) e Santa Casa de Cardoso (455.627,64).

O repasse foi definido pela Lei Complementar 197, de 2022, que estabeleceu que os saldos financeiros remanescentes, provenientes de repasses do Ministério da Saúde nas contas abertas dos estados, Distrito Federal e municípios, antes de 1º de janeiro de 2018, fossem aplicados para custeio de serviços prestados por entidades privadas sem fins lucrativos que complementam o SUS, até atingir o valor de R$ 2 bilhões.

Uma portaria publicada em dezembro do ano passado, no entanto, dificultava o acesso de estados e municípios aos valores, como a exigência de Certidão Negativa de Débitos, além de estabelecer um prazo curto para a comprovação dos critérios.

Depois de reunião com o setor no início de janeiro, a atual gestão federal revogou a portaria que criava entraves aos repasses e publicou um novo documento que define o valor máximo destinado a cada entidade filantrópica, considerando a proporção total de instituições registradas nas bases de dados dos Sistemas de Informações Ambulatoriais e Hospitalares, entre 2019 e 2021.

“A quantia trará fôlego às instituições filantrópicas que enfrentam crise sem precedentes, em razão de duas décadas de defasagem dos valores dos procedimentos SUS, cenário agravado durante a pandemia”, avaliou Mirocles Véras, presidente da Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB).

Por meio de nota, a Secretaria Estadual de Saúde informou que também ajuda as Santas Casas da região de Rio Preto por meio de convênios firmados através do programa Mais Santas Casas, no valor de R$ 284,5 milhões de reais.

"Além disso, a Secretaria Estadual de Saúde reforça que o Departamento Regional de Saúde (DRS) de Rio Preto está em constante diálogo com os gestores de saúde da região para discutir formas de apoiar o fortalecimento e ampliar a assistência necessária à população local”, afirmou em nota. (RC)

As Santas Casas do Noroeste Paulista

  1. Santa Casa de Misericórdia Oswaldo Siqueira Lyra – Auriflama
  2. Santa Casa de Misericórdia São Francisco – Buritama
  3. Santa Casa de Misericórdia de Aparecida d’Oeste – Aparecida d’Oeste
  4. Santa Casa de Misericórdia de Estrela d’Oeste – Estrela d’Oeste
  5. Santa Casa de Misericórdia de Fernandópolis – Fernandópolis
  6. Santa Casa de Misericórdia de Ibirá – Ibirá
  7. Santa Casa de Misericórdia de Nossa Senhora das Dores – General Salgado
  8. Santa Casa de Riolândia – Riolândia
  9. Santa Casa de Misericórdia de Santa Adélia – Santa Adélia
  10. Santa Casa da Misericórdia de Jales – Jales
  11. Santa Casa da Misericórdia de Palmeira d’Oeste – Palmeira d’Oeste
  12. Santa Casa da Misericórdia de Santa Fé do Sul – Santa Fé do Sul
  13. Santa Casa de Misericórdia de José Bonifácio – José Bonifácio
  14. Santa Casa de Urânia – Urânia
  15. Santa Casa da Misericórdia de Monte Aprazível – Monte Aprazível
  16. Santa Casa da Misericórdia de Nova Granada – Nova Granada
  17. Irmandade São José – Novo Horizonte
  18. Santa Casa de Misericórdia de Olímpia – Olímpia
  19. Santa Casa de Misericórdia de Paulo de Faria – Paulo de Faria
  20. Santa Casa de Misericórdia de Pereira Barreto – Pereira Barreto
  21. Santa Casa Leonor Mendes de Barros – Cardoso
  22. Santa Casa de Misericórdia de Rio Preto – Rio Preto
  23. Santa Casa de Misericórdia de Cajobi – Cajobi
  24. Santa Casa de Misericórdia de Populina – Populina
  25. Santa Casa São Vicente de Paulo – Tanabi
  26. Santa Casa de Misericórdia de Votuporanga - Votuporanga

A saúde pública em Rio Preto

1540

  • Ano da criação do primeiro hospital do Brasil, a Santa Casa de Misericórdia de Olinda, em Pernambuco, que funcionou até 1630. Três anos depois, em 1543, é inaugurada a Santa Casa de Misericórdia de Santos (SP), que existe até hoje, sendo o hospital mais antigo do País em operação

1908

  • Começa a nascer a ideia da construção do primeiro hospital da cidade. Por iniciativa de maçons rio-pretenses, nasce o projeto da Santa Casa de Rio Preto. Na Câmara Municipal, em 1909, a instalação foi discutida e uma diretoria eleita, com o objetivo de obter verbas municipais para o projeto

1911

  • A Liga Operária, fundada pelo professor José Palma, decidiu prestar serviços à comunidade e reuniu pedreiros e carpinteiros para ajudar nas obras da Santa Casa de Rio Preto, sem nada cobrar pelos serviços. A ajuda permitiu o início de atendimento na Santa Casa. Entretanto, apesar dos esforços, em 1915, a Santa Casa de Rio Preto fechou suas portas por falta de recursos

1918

  • A epidemia de gripe espanhola fez com que a Santa Casa de Rio Preto fosse reaberta. No entanto, depois do término da epidemia, a instituição teve novamente suas atividades paralisadas

1922

  • Finalmente, em 12 de março de 1922, a Santa Casa de Rio Preto foi reaberta pela segunda vez e passou a ser referência regional em saúde. Nos primeiros anos, o principal médico foi o doutor Fritz Jacobs

1924

  • O Hospital Santa Helena é fundado. A instituição foi a principal da região de Rio Preto, na primeira metade do século 20. Para ter uma ideia, no início dos anos 1920, foram realizadas no Hospital Santa Helena as primeiras operações de estômago, fígado e intestino do interior do estado de São Paulo

1952

  • Iniciam-se as obras Hospital Infante Dom Henrique da Beneficência Portuguesa, que somente foi inaugurado e teve atendimento à população de Rio Preto e região a partir de abril de 1968

1953

  • Começa a funcionar o Hospital Adolfo Bezerra de Menezes, com a missão de tratar pacientes com transtornos mentais e oferecer serviços para os mais desprovidos da sociedade

1954

  • Iniciam-se as obras do Hospital das Clínicas, hoje Hospital de Base, que somente foi inaugurado em 12 de junho de 1967 para atendimento da população. A ideia era implantar um hospital regional público, no estilo do que já existia em Araraquara

1968

  • Com a construção de dois novos hospitais a partir da década de 1950, cresce o desejo da instalação de uma faculdade de medicina em Rio Preto. O sonho virou realidade em 1968, quando o Conselho Federal de Educação autorizou o funcionamento da Faculdade Regional de Medicina de São José do Rio Preto (Farme)

1970

  • Ano que Hospital de Base de Rio Preto é instituído como de caráter filantrópico e como hospital de ensino da Faculdade Regional de Medicina de Rio Preto (Farme), hoje, Famerp

1971

  • Surge o Hospital Ielar, que em crise fechou as portas no dia 29 de março de 2017. O hospital era responsável por uma média de sete mil atendimentos por mês na cidade

1975

  • Um grupo de médicos formados e de professores da primeira turma de medicina da Famerp compra um terreno e resolve construir um hospital. No dia 19 de janeiro de 1980, o Hospital Austa é inaugurado

1994

  • Faculdade Regional de Medicina de São José do Rio Preto (Farme) é estadualizada e passa a ser chamada de Faculdade de Medicina de Rio Preto (Famerp). Com investimentos públicos, instituição passa a ser reconhecida pelas suas pesquisas

2009

  • Inaugurado o Hospital João Paulo 2º e o Ambulatório Médico de Especialistas (AME) de Rio Preto, com objetivo de suprir o déficit na oferta de serviços de média e alta complexidade ambulatorial para pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) da região

2012

  • Inaugurados mais dois cursos de medicina em Rio Preto. Através de autorização do Conselho Nacional de Saúde e do Ministério da Educação, Faceres e Unilago iniciam aulas das suas primeiras turmas

2013

  • Nasce o Hospital da Criança e Maternidade, chamado carinhosamente de HCM. O hospital que funciona integrado ao Hospital de Base é dedicado às crianças e às mães

 

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